Sede Vodafone
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Cliente: Vodafone
Tipo: Serviços
Localização: Lisboa, Portugal
Área: 50.000 m2
Conclusão: 2000
Este novo objecto posiciona-se sobre um enorme lote quase quadrado, na ilharga sul da praça, entre a Avenida dos Oceanos, frente ao Pavilhão de Portugal, e a Avenida D. João II, atrás, ganhando altura na metade mais recuada, conforme previsto no plano para a zona, que propõe um esbatimento do impacto volumétrico das construções em função da sua proximidade ao rio. (…) O edifício, depois de resolver as zonas de área mais significativa em subsolo (tirando partido do desnível entre as duas avenidas paralelas e recorrendo a simpatiquíssimos pátios para iluminação desses espaços), distribui os open-spaces de escritório por dois corpos compridos de nove pisos, orientados nascente-poente e ocupando as margens do terreno. Uma parede em betão, à qual interiormente se vem colar um complexo sistema de rampas/saídas de emergência, une as duas alas, do lado poente, cercando o interior. Uma improvável ponte com dois pisos de altura (a altura das enormes vigas que misteriosamente o sustêm) cruza o ar, à frente, faceando o rio e sobrevoando o nosso olhar entre o 6º e 8º piso, por cima da pala de Siza Vieira, num andamento que, fechando o quadrilátero a nascente – por o fazer no alto –, simultaneamente nos emociona e perturba.
Temos assim um quadrado forte envolvendo o centro do lote, construindo um enorme pátio de sossego para onde espreitam circulações e salas de trabalho. Mas nem o grande paredão nem, muito menos, a ponte em frente nos impedem a vista sobre a água ou o resto da cidade: antes a enquadram, significando-a através da geometria. A parede poente, não atingindo o solo, permite-nos, à cota da avenida, visualizar o Pavilhão de Portugal, de um modo muito mais expressivo e intencional que aquele que nos era dado quando apenas um parque de estacionamento ocupava o local; depois, a grande janela, através da qual, de baixo, só vemos a extravagante passagem das rampas de emergência, como um cruzado atar de fitas que apertassem um gigantesco espartilho, possibilita-nos, ao passarmos pela gare, a rápida e fugaz vista da água: promessa emoldurada. No interior sentimos a ponte a fechar os enquadramentos de céu, balizando o pátio com a horizontalidade daquele fecho, àquela altura, enorme boca de cena ao ar livre mostrando a cidade. (Planos e volumes úteis que, ao mesmo tempo que reservam o espaço dentro, promovem o olhar inteligente.)
É notável o modo como os arquitetos hierarquizaram e distribuíram as massas, conseguindo prolongar, em simultâneo, a partir de um programa terciário relativamente corrente, o rendimento plástico da obra pousada em frente, sem para isso necessitarem de recorrer a nenhum mimetismo vocabular ou enfático apagamento. Com o seu edifício constroem cidade porque a cidade é isto: a soma de sentidos úteis que chegam de todos os lados, cada qual referindo-se ao que de mais importante foi sendo eleito, concorrendo para a escrita da complexidade desse organismo cuja maior sedução será a constante imprevisibilidade com que nos acolhe. Por dentro os espaços de trabalho vão nos surpreendendo pelo modo como recebem e rebatem a luz (através de «pátios à inglesa», junto às laterais, ou pátios mais abertos no meio, todos paisagisticamente diferenciados, num trabalho muito subtil e moderno de João Gomes da Silva[) através da refração dos espelhos de água ou do sombreado da agitação dos bambus ou, ainda, das janelas corridas voltadas às ruas, conforme os corpos vão subindo. Nessas janelas surgem estores metálicos articulados que, possibilitando o controlo pelo interior, vão modelando texturas variadas e complexas na pele voltada à cidade. Esta textura móvel é depois aproximada por outra mais estável, preenchendo o resto das paredes, uma série de bocados de paralelepípedo em chapa lacada, construindo uma espécie de «casa dos bicos» que o acidental da gestão angulosa do movimento dos estores/portadas altera constantemente, compondo um quadro de enorme dinamismo.
Excerto de texto integrante do livro 30 Exemplos (Arquitetura Portuguesa no Virar do Século XX) de Manuel Graça Dias, 2004
Fotografia © FG + SG
Fotografia © FG + SG